Grêmios escolares: entre a tutela e a invenção democrática
O movimento dos estudantes secundaristas em 2015 foi certamente a melhor criação política do ano. Há muito o que refletir e aprender sobre tudo o que aconteceu e continua vibrando.
A existência de centros acadêmicos nas escolas, para além de um importante direito conquistado, é um espaço relevante de aprendizado e exercício democrático. Por isso, chamou minha atenção o fato que alguns dias atrás o jornal O Estado de São Paulo publicou uma matéria intitulada “Governo de SP vai reformular grêmios de escolas estaduais” [1]. A matéria utiliza como referência um levantamento solicitado pelo MPE sobre a existência dos grêmios nas escolas da rede estadual de São Paulo. Em síntese, o estudo mostra que muitas escolas possuem um centro estudantil, porém ele é frequentemente pouco participativo ou efetivo na sua missão representativa da comunidade escolar.
Interessante que a matéria do jornal procura estabelecer uma relação entre as ocupações das escolas e a existência frágil desses gremios estudantis. O argumento segue a seguinte premissa: se houvessem gremios estudantis ativos e bem organizados as reivindicações dos estudantes poderiam ter sido canalizadas pelas vias institucionais, e assim os problemas seriam resolvidos pela administração escolar. Na ausência de espaços de representação institucional o movimento dos estudantes torna-se alvo fácil de grupos políticos extra-estudantis, ou então as reivindicações tornam-se mais conflituosas, levando a resultados inesperados como a ocupação das escolas. Nas palavras da gestora responsável pelos gremios na Secretaria Estadual de Educação: “Uma gestão participativa mais forte cria uma relação muito importante com a comunidade, alunos, professores e família. A escola fica mais calma”.
A reportagem funciona como ótimo recurso reflexivo sobre a natureza ambígua desses grêmios estudantis.
Em primeiro lugar, como muitos dos nossos espaços de representação institucional, parte dos gremios escolares acabaram convertidos em aparelhos da gestão burocrática (quando dominados pela própria administração escolar) ou em espaços dominados por grupos políticos fortemente identidários (com bandeiras e programas prontos e desconectados da vida estudantil). Os estudantes sabem disso. Por isso, eles criaram novas agremiações que escapam à tutela dos diretores, da SEE, dos partidos e das associações estudantis tradicionais. Em suma, ao contrário do que a matéria parece sugerir, as ocupações das escolas nascem de coletivos e grêmios independentes que não sofrem de um deficit democrático. Nesses casos os estudantes estão, efetivamente, fazendo invenções democráticas exatamente onde a política estava morta porque convertida em ação gestionária.
Em segundo lugar, o que a reportagem parece esquecer é que o problema da reestruturação escolar, da forma como foi proposta, escapa à própria capacidade deliberativa de uma unidade escolar e suas instâncias internas de participação. Trata-se de uma política de Governo (G.Alckmin) muito mais ampla. Ou seja, mesmo que uma escola tivesse ótima qualidade de participação democrática, sua posição com relação à reestruturação enfrentaria a resistência das instâncias administrativas superiores. Os estudantes também sabem disso. Por isso sua luta não poderia se limitar às instâncias locais de representação.