Informação, tecnicidade, individuação: a urgência do pensamento de Gilbert Simondon
__________[APRESENTAÇÃO]
A obra de Gilbert Simondon permanece, ainda hoje, muito pouco conhecida no cenário acadêmico e intelectual brasileiro, apesar de seu crescente destaque, não apenas no campo da filosofia, mas também no das ciências sociais contemporâneas. Filósofo marginalizado e frequentemente reduzido à questão da técnica, Simondon oferece recursos poderosos e ainda muito pouco conhecidos para se pensar as relações sociais entre humanos e também entre humanos e não-humanos de perspectivas variadas, sejam elas sociológicas, antropológicas, políticas, filosóficas, epistemológicas ou estéticas. Suas concepções de informação, tecnicidade, individuação, transdução, metaestabilidade, transindividual, concretização, invenção e tecno-estética, entre outras, vêm oferecendo alternativas valiosas para o avanço na compreensão de temas centrais da contemporaneidade como o trabalho, a mobilização coletiva, as transformações sociais, a presença da tecnologia na vida cotidiana, as tensões entre ética e ciência, as relações entre indivíduo e sociedade, biologia e técnica, natureza e cultura etc. O Grupo de Pesquisa Conhecimento, Tecnologia e Mercado (CTeMe), impelido pela urgência de retomar o movimento do pensamento de Simondon, de colocar seus conceitos e suas ideias para funcionar no contexto contemporâneo, convidou alguns pesquisadores brasileiros e estrangeiros de diversas áreas – sociologia, antropologia, filosofia, arte, design e computação – e instituições – Conicet (Argentina), Fatec (Jundiaí), PUC-SP, UBA (Argentina), UFRJ (IFCS e Museu Nacional), UFPR, UnB, Unicamp e Unifesp – envolvidos em atividades de alguma forma relacionadas à importância e urgência do pensamento de Simondon, para três dias de debates no IFCH/Unicamp. A escolha dos pesquisadores convidados foi criteriosa, orientada não por política institucional e especialização disciplinar ou temática, mas sim por afinidades estético-políticas distribuídas em redes heterogenéticas. Certamente, muitos outros pesquisadores brasileiros que vêm trabalhando com as ideias simondonianas poderiam ter sido convidados para este encontro ou citados aqui; trata-se de um estímulo para que ele se desdobre em novas oportunidades de ampliar cada vez mais o coletivo mobilizado em torno da urgência do pensamento de Simondon. Por hora, e para um encontro que começou como um sonho sem nenhum fundamento na realidade burocrática e institucional das agências de financiamento e do mundo acadêmico brasileiro atual, até que não nos saímos tão mal. O encontro “Informação, tecnicidade, individuação: a urgência do pensamento de Gilbert Simondon” ocorrerá nos dias 2, 3 e 4 de abril no Auditório I do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas (IFCH) da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP), com acesso livre e transmissão pela internet (streaming).
__________[PROPAGAÇÃO]
Disponibilizamos aqui algum material com o objetivo duplo de divulgar o encontro e a obra de Simondon. Por um lado, disponibilizamos as traduções para o português dos capítulos introdutórios das duas obras mais importantes de Simondon, Du mode d’existence des objets techniques – traduzido por Pedro P. Ferreira e Christian P. Kasper e já publicado anteriormente, com o título de “Cultura e Técnica”, na revista Nada (no.11, 2008) – e L’Individuation à la lumière des notions de forme et d’information – traduzido por Pedro P. Ferreira e Francisco A. Caminati e ainda não publicado. Por outro lado, disponibilizamos também transcrições de aulas e passagens de textos de Laymert Garcia dos Santos, que há décadas mobiliza Simondon na articulação sócioantropológica de muitos dos principais problemas contemporâneos. Apesar de evidentemente não ser o único a empregar Simondon no campo intelectual brasileiro contemporâneo, Laymert se destaca por seu pioneirismo, pela consistência de sua leitura e pelo acesso privilegiado que oferece às ideias do filósofo. As aulas transcritas ocorreram nos dias 02/03/2011, 16/03/2011 e 30/03/2011 no IFCH/UNICAMP, quando Laymert debatia partes de Du mode d’existence des objets techniques com alunos, numa disciplina de pós-graduação dedicada exclusivamente ao debate das ideias de Simondon. Quanto aos textos, selecionamos passagens de sete textos diferentes publicados entre 1981 e 2011, nas quais Laymert mobiliza Simondon para pensar não apenas a tecnologia em sua especificidade (tecnicidade, concretização, invenção) e em sua relação com o humano (a relação homem-máquina) e com a sociedade (o conjunto sociotécnico), mas também temas específicos como trabalho, progresso, alienação, artificialização, xamanismo, ambientalismo, informação, cibernética, memória, vida e individuação. São eles: Desregulagens (1981, pp.23-7); “O homem e a máquina” (Imagens, 1994, pp.48); “Tecnologia, natureza e a redescoberta do Brasil” (Tecnociência e Cultura, 1998, pp.38-43); “A informação após a virada cibernética” (Revolução tecnológica, internet e socialismo, 2003, pp.12-3); “Demasiadamente pós-humano” (Novos Estudos Cebrap, 2003, pp.166-7); “Paradoxos da propriedade intelectual” (Propriedade Intelectual, 2007, pp.52-7); “Ópera multimídia Amazônia” (Cadernos de Subjetividade, 2011, pp.34-5). Esperamos que este material contribua para a propagação das ideias de Simondon no Brasil – uma contribuição inevitavelmente situada e parcial, mas por isso mesmo ativa e engajada.
__________[PROGRAMAÇÃO]
Dia 02 de abril de 2012 19h – Mesa 1 – Modos de existência: A mesa de abertura, pela sua heterogeneidade e importância, indica o propósito do evento: alertar para a atualidade e urgência da transdisciplinaridade do pensamento de Gilbert Simondon em nossa contemporaneidade. Nesse sentido, o sociólogo Laymert Garcia dos Santos (Unicamp) explorará as relações e tensões entre estética e sociedade no pensamento de Simondon e Étienne Souriau; a filósofa Muriel Combes desenvolverá uma releitura da problemática do sujeito em sua relação com o biopoder e a biopolítica; e o antropólogo Eduardo Viveiros de Castro (UFRJ) considerará o problema do estatuto da relação na antropologia contemporânea, considerando o recente debate em torno das “object-oriented-ontologies”. A mesa será mediada por Christian P. Kasper (UFPR).
22h30 – Diálogos e Ressonâncias no Almanaque Café: Improviso Livre com Thomas Rohrer e convidados.
Dia 03 de abril de 2012 9h30 – Mesa 2 – Tecnopolíticas: Em sua filosofia da técnica, Gilbert Simondon aponta a urgência de problematizar as relações cotidianas entre o ser humano e os objetos técnicos que o rodeiam a partir de uma análise que ultrapasse um pensamento autocrático. Nesse esforço, surge a necessidade de uma politização específica da tecnologia que escape tanto da tecnofilia quanto da tecnofobia. As configurações sociopolíticas da técnica e da tecnologia serão tema de uma mesa de discussão específica, em que os debatedores Henrique Parra (Unifesp), Silvio Rhatto (Saravá.org) e Rafael Diniz (WiMobilis) discutirão, a partir de suas próprias investigações, a dimensão política das relações atuais entre “homem e máquina”. A mesa será mediada por Stefano Schiavetto (Unicamp).
14h30 – Mesa 3 – Individuações: Considerando a necessidade de se compreender o pensamento de Simondon para além do campo restrito de uma “filosofia da técnica”, esta mesa permitirá considerar a importância de sua obra no interior do pensamento filosófico contemporâneo, lembrando da advertência do próprio filósofo para a necessidade de uma reforma das noções filosóficas fundamentais. Nesse sentido, os pesquisadores e filósofos Oswaldo Giacoia Jr. (Unicamp), Pablo E. Rodríguez (Conicet) e Peter Pál Pelbart (PUC-SP) colocarão em discussão as implicações políticas e filosóficas da noção simondoniana de individuação. A mesa será mediada por Rodolfo E. Scachetti.
19h – Mostra Harun Farocki (“A mira certeira da câmera: linguagem, política e ideologia”) na Casa do Lago: Exibição do filme Como se vê (Wie man sieht), seguida de debate com Laymert Garcia dos Santos.
Dia 04 de abril de 2012 9h30 – Mesa 4 – Informação: Crítico com relação à tradição dualista do pensamento ocidental moderno, fundado em oposições como indivíduo/sociedade, homem/máquina ou natureza/cultura, Simondon propõe novas maneiras de pensar as relações entre técnica, estética e vida, notadamente a partir de um método genético. A tecnoestética, na medida em que representa uma das ocasiões de convergência das fases do ser, está diretamente relacionada ao conjunto de seu pensamento, em específico à noção de informação e de processo de individuação. A mesa composta pelos pesquisadores Diego J. Vicentin (Unicamp), Cecilia Diaz-Isenrath (UBA, Argentina) e Emerson Freire (Fatec, Jundiaí) oferecerá um contexto para a discussão em torno das interrelações entre técnica, estética, informação e individuação no pensamento simondoniano. A mesa será mediada por Marta M. Kanashiro (Labjor/Unicamp).
14h30 – Mesa 5 – Sócio-antropotécnica: A técnica, para Simondon, é parte de um processo de individuação mais amplo envolvendo indivíduos físicos, biológicos e psicossociais. Assim, a técnica e os objetos técnicos surgem como resolução parcial para o problema da relação do ser humano com o mundo. O problema da invenção é central aqui, evidenciando a contribuição do pensamento de Simondon sobre a individuação para pensar questões antropotécnicas e sociotécnicas. A mesa composta pelos pesquisadores Carlos E. Sautchuk (UnB), Daniela T. Manica (UFRJ) e Christian P. Kasper (UFPR) envolverá, assim, contextos etnográficos particulares e conexões conceituais singulares em um debate sobre técnica, objetos e invenção. A mesa será mediada por Rainer M. Brito (UFSCar).
__________[RESSONÂNCIAS]
Mostra Harun Farocki – A mira precisa da câmera: linguagem, política e ideologia: Aulas públicas com Laymert Garcia dos Santos na Casa do Lago (Unicamp).
13/03 – 16h (sem debate) e 19h(com debate): Natureza morta (Stilleben, 1977).
20/03 – 16h (sem debate) e 19h (com debate): Videograma de uma revolução (Videogramme einer revolution, 1992)
27/03 – 16h (sem debate) e 19h (com debate): Reconhecer e perseguir (Erkennen und verfolgen, 2003)
03/04 – 16h (sem debate) e 19h (com debate): Como se vê (Wie man sieht, 1986)